É
uma sedução irresistível refazer o caminho das origens e encontrar em cada
curva, mesmo dolorosa, um apelo à renascença do melhor que em nós habita. Isso
foi a surpresa que nos esperavam as duas datas traçadas na pedra que cobre o átrio das gentes da nossa
comunidade: 1999 e 2019. Surpresa
não terá sido exactamente, talvez conquista poderá chamar-se ao que então
aconteceu. E porque é desses conteúdos que nos ocupámos, em comunidade, nestes
dois dias, permitam-me partilhá-los convosco muito resumidamente, em virtude da
soma de tarefas a que nos obriga a época
natalícia.
VIII
1999
Passado
o cabo das tormentas terrestres de1985 e atiradas à agua turva das ‘cisternas
rotas’ as facécias sacro-cómicas de 2010 (às quais já nos referimos nos dias transactos) a
Ribeira Seca confirmou a força do direito que está no Povo - em contraste
aberto com o direito da força que assiste aos poderosos – e aí reforçou o seu
templo, requalificando-o no alargamento do espaço utilizável, bem como no aperfeiçoamento
estético das suas linhas originais, sempre na convicção de que, em qualquer
comunidade viva, a igreja é o presépio
quotidiano, inamovível, onde todos se reúnem em redor de um Jesus mobilizador
das consciências. Esta é uma igreja à medida dos utentes: modesta de forma e
potencialmente rica de fundo. Recusámos as ambições megalómanas das sósias
Vaticanas, onde o Jesus de Belém decerto recusar-se-ia assentar arraiais, mais
que não fosse pela configuração gémea do Capitólio, sede do poder capital e do
armamento. Também não esperámos nenhum apoio do regional apoio ‘grego’ das
estruturas governativas porque, pela experiência colhida na construção de
outras igrejas madeirenses, tais apoios mais não são que rasteiros ‘cavalos de
Tróia’ desejosos de penetrar nos aldeamentos da população rural. Ela aí está, a
autêntica ‘Igreja Popular’, como o Povo canta, na mais genuína semântica deste
qualificativo. Foi esta mais uma manifestação do Natal rejuvenescido no meio de
nós.
\ IX
2019
Terá
sido, porventura, a mais retumbante vitória deste rincão rural,, vitória contra
a ditadura eclesiástica que, durante mais de quarenta e cinco anos manteve o
decreto de afastamento do pároco, chegando a suspendê-lo ‘a divinis’, sem qualquer
processo jurídico-canónico. Preferia que outrem sinalizasse e comentasse este
procedimento anómalo, dado que, como é sabido, o caso tem a ver com o
subscritor destas linhas. Apraz-me tão só relevar um sintoma que define a
justiça eclesiástica, sucedânea da Igreja Inquisitorial, possessora de um poder
discricionário sem rédeas e do mais supino direito processual, visto que neste
caso os extremos tocam-se: o suposto “réu” foi condenado sem processo e, com a
mesma insustentável leveza jurídico-canónica, sem processo foi absolvido!...
Ridicule, mais chatmant.
Isto também é Natal, mesmo fora de
Dezembro.
Encerro
aqui, já em véspera de Festa, o ciclo
novenário das
tradicionais
“Missas do Parto” do ano 2022, as últimas que me foram dadas para reflectir e
mais tarde recordar.
Hoje,
Festa do Perdão para a comunidade da Ribeira Seca, tentámos ver e viver em
retrospectiva os Natais de outrora. Somos herdeiros de um legado de seiscentos
anos, talentos e mediocridades, grandezas e misérias dos nosso antepassados. Somos nós a “fénix
renascida” do Brazão de Armas de Branca Teixeira. Neste renascer quotidiano,
que legado deixaremos às gerações vindouras, que Natal transmitiremos?!...
23-24.Dez.22
Martins Júnior
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