Continuam
os reflexos da Semana do Concelho de Machico, em boa hora instaurada no dia 8
de Maio – a histórica data do nascimento de Machico para o quadro orgânico-administrativo
do país por meio da Carta de Doação de Machico a Tristão Vaz Teixeira como Primeira
Capitania, outorgada pelo Infante Dom
Henrique, em 8 de Maio de 1440, dez anos antes da Capitania do Funchal. Continuam
as comemorações na semana que ora começa com a abertura da Feira do Livro.
No
penúltimo escrito considerei (e hoje confirmo) Machico como laboratório e ex-libris
exemplar dos três “D” – Descolonizar, Democratizar, Desenvolver – os ideais
da Revolução dos Cravos. Como prometido, farei do terceiro “D” a inspiração e
objecto do presente texto: o Desenvolvimento. Porque, mas não só, à míngua de
argumentos sólidos, os detractores da belíssima estância, alcandorada nos
poemas épicos Insulana de Manuel Tomás e Zargueida de Francisco
de Paula Medina de Vasconcellos, arregimentam-se
os ditos olhares enviesados recorrendo aos velhos tiros de pólvora seca de que ‘Machico
não tem desenvolvimento’. É a bobine, estafadamente rebobinada há quase 50
anos, que “Machico é o terceiro mundo” e até “o quarto”, ouvi eu de um já
encalhado secretário regional de outras eras.
Pois
bem, sem pretender defender tese na matéria, o que se questiona em primeira mão
é o conteúdo do decantado “Desenvolvimento”. Para os detractores desenvolver é
tão-só “betonar”, se possível fazer de Machico um decalque do afogado Puerto
Rico canariano, impermeabilizando toda a paisagem desse a baía até ao Pico do
Facho. Não me sai da memória o que me
observou o abalizado arquitecto Siza Vieira, presente em Machico a meu pedido,
em 1993, como a gravura documenta, em reunião nos Paços do Concelho,
precisamente há trinta anos: ” Presidente trate-me isto (a faixa do cais e toda
A zona ribeirinha) trate-me isto com pinças”.
O
que se viu depois, sob a megalómana batuta dos ‘desenvolvimentistas’? Muralhar,
vedar o amplo anfiteatro de Machico com um bruto tapume de betão, a que deram o
pomposo nome de “Forum”. Passaram à zona do cais e zás, assassinaram a beleza
ímpar dos baixios milenares com o desaterro de um monstro erguido no centro da
cidade e, logo, a safra do betão em sofreguidão. Mais adiante, o ma gosto, cego
e surdo, atirou para o frontespício verde da baía mais uma amostra de elefante
branco que baptizaram como “etar”-terminal de águas residuais, mas o povo que
tem olfacto apurado deu-lhe o expressivo título de hotel da m…., devido aos
maus cheiros que exala em tempo quente.
Poderia
adicionar outros ‘tesourões deprimentes’, mas fico-me por aqui, sem esquecer
que no ano de 1997 ouvi da boca do super-betonador da Ilha esta jura
soleníssima a um conhecido empresário-patrão de empreendimento, na Quinta do
Lord, Caniçal, em não menos solene cerimónia: “Tudo quanto a vossa firma
pretender fazer aqui, tenha a certeza que o meu governo aprovará”. E o que saiu
dali? Uma floresta de cimento em zona classificada como Non aedificandi. Aproveito para
informar a população e, directamente, a organização Cosmos que aquele bairro
invasivo em zona Non aedificandi -
repito - foi feito à revelia da Câmara à qual então eu presidia. Além de que
toda aquela extensa faixa ocupada pela Zona Franca retirou aos habitantes do Caniçal o território
de eleição para implantação natural do seu direito a habitação própria.
Machico
faz a sua marcha na senda de um justo ordenamento urbanístico, adequado à sua
dimensão e à simbiose entre mar e serrania com que tão sabiamente a natureza o
dotou, sem agressões à paisagem, descontando os erros grosseiros que os actuais
detractores cometeram e agora sem hipótese de retorno.
O
concelho merece uma mais que positiva descriminação por parte da governação
regional, tendo em conta a amputação que lhe foi feita pela mesma entidade para
a construção do aeroporto, no superior interesse de toda a Madeira, é certo, mas em detrimento de valiosíssimos equipamentos
turísticos locais, como foi o caso da destruição do mais bem concebido Aldeamento Turístico de Portugal, a Matur-Grão
Pará. Machico ainda não foi ressarcido de tão prestimosa ´doação’ à Região e ao País. Venha a justíssima e
almejada reparação dos danos, mas sem a proliferação de danos maiores,
megalómanos, escandalosamente volumétricos, como muitos dos que são deferidos
no Funchal.
O
denominado wellfare de uma nação mede-se pelo bem-estar do seu povo, não
pelos dinossauros de betão devoradores da paisagem e do ar que respiramos. E é
neste programa de saúde e desporto, cultura e convivialidade que Machico
investe no terreno. Sem alardes nem páginas de publicidade pagas do erário
público. Após o Dia do Concelho, começa a Feira do Livro.
Foi
sumamente gostoso estar com de Luís Represas, ao vivo, no último fim de semana,
em Machico, a sua voz límpida e sonora
enchendo o Grande Largo, junto à praia, com o rumorejar das ondas em fundo
orquestral. . E ouvi-lo recordar à multidão o dia em que cantou pela primeira
vez nesta cidade, há 41 anos no palco aberto da Ribeira Seca. Ele, Sérgio Godinho, Amélia Muge
e o inolvidável TROVANTE. Aos quais poderíamos juntar Janita Salomé, Vitorino e
os saudosos José Mário Branco e Pedro Barroso.
15-16.Mai.23
Martins
Júnior
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