Ao aproximar-se um grande
dia, o 29 de Março, tem-me batido aos
olhos e aos ouvidos um rap-rap tão
insistente quanto indigesto à consciência de muitos com quem tenho trocado
impressões sobre o mesmo tema: ”Maioria Absoluta, Maioria Absoluta. Queremo-la
para assegurar paz e estabilidade”.
Irritante
esta lengalenga, viesse de onde viesse, mas sobretudo quando vem daqueles que
comeram, beberam, banquetearam-se à mesa dessa “pseudo-estabilidade”, adulando
o mordomo-mór e que, só no fim, quando o astuto mordomo se tornou velho e
condenado a sair da távola redonda, é que se lembraram de “cuspir no prato em
que comeram” (assim se lamentava o velho) e, depois, atirar-lhe os pratos e
talheres à cara. Para quê?...Imaginem, para fazer exactamente o mesmo que fez durante 40 anos e contra o qual,
agora, se revoltam, nem querem que “ele” apareça. Mas, porque “ele” é o mesmo, travestido embora com visual
recauchutado, eis que lhe querem seguir as pegadas e clamam, aos brados como o
outro, maioria absoluta para garantir estabilidade.
Já me referi a este peditório em 17 e 19 de
Março, mas agora volto a questionar-me sobre o conceito de estabilidade. E há,
pelo menos, dois: a estabilidade mórbida como a paz dos cemitérios, onde tudo
está bem, tudo se está dissolvendo em pó e ninguém levanta a voz. É caso para
perguntar se os ditos pretendentes à maioria absoluta querem transformar a
“Quinta Vigia” numa qualquer “Quinta dos Calados”? Seria recuar aos anos 50 do
século passado, onde ali funcionava o Cemitério das Angústias”.
Mas
há outro conceito: a estabilidade férrea dos regimes totalitários, o de
Salazar, de Hitler, o de Mussolini e outros que tais, o do velho mordomo, agora
de saída forçada. Esta pseudo-estabilidade é bem pior que a primeira: é que nos
cemitérios os encarcerados não reagem nem falam porque não têm força nem voz.
Ao passo que, na segunda, os seus
constituintes, agora votantes, têm voz, mas o ditador amordaça-os; têm braços e
pernas, mas o mordomo manda os capangas amarrá-los, de pés e mãos.
Analisemos
casos concretos: a estabilidade das setas espetadas para o céu foi a que
depenou e espetou o povo madeirense com impostos mais pesados que no
continente, foi o mesmo que descapitalizou
as Câmaras Municipais da Região, através de um contrato leonino, falaciosamente
denominado Protocolo de Reequilíbrio Financeiro. Onde estavam os que agora
bradam por estabilidade? Comendo e bebendo à mesa da “Quinta dos Calados”,
felizes e caladinhos. E onde estavam estes mendigos da maioria absoluta quando
o ditador, espumando raiva, porque derrotado nas urnas, devorava os ecrãs
televisivos, vociferando como um louco: “Pra Machico nem um tostão”?! Até os
próprios deputados eleitos por Machico, renegando a sua “pátria” e os seus
conterrâneos, alambazavam-se de espasmo perante
o resfolgar paranóico do chefe. E onde estavam esses advogados da
estabilidade quando o déspota fez sangue entre aqueles que, do mesmo partido,
foram expulsos, saneados do seu posto de trabalho, só porque discordaram do
poderoso absoluto? Cobardes, batendo palmas e beijando o pé do dominador, com
medo que ele se voltasse para o mísero bajulador.
Devo
dizer que fiquei abismado quando o pretendente ao trono invectivou as Câmaras
extra-regime absolutista vigente por não fazerem obras, sabendo a asfixia
financeira a que estão sujeitas e, sobretudo, deixando ele mesmo uma dívida sua
de 100 milhões de euros para os outros pagarem.
Nesta altura, todo e
qualquer partido que seja eleito tem de fazer uma cura anti-absolutista. Num
país civilizado os cidadãos sabem conviver com a democracia, ou seja, com a
alternativa ou, pelo menos, com a alternância do poder. Absolutismos
hereditários (é o que estes querem) só em regimes afro-asiáticos com um régulo
da mesma família ou um feiticeiro da mesma tribo. Sejamos civilizados.
Ensinemos os nossos governantes a saberem ouvir-se uns aos outros, porque, lá
diz o adágio, da discussão nasce a luz. E com toda a razão, como demonstra a
descoberta da energia eléctrica produzida pela convergência do positivo e
negativo. Quando nos habituamos ao debate divergente, a divisão transforma-se
em multiplicação de iniciativas e sucessos.
Por
tudo isto, unamo-nos no combate às Maiorias Absolutas, para instaurarmos um
regime onde todos possam viver e respirar, tal como os nossos antepassados
lutaram pelo regime liberal contra o absolutismo miguelista. Qualquer
semelhança é pura coincidência. Se bem que, no caso presente, a coincidência
faz-se realidade. Seja como for, o emergir de novas representações
parlamentares virá refrear o impulso açambarcador das maiorias. Será uma boa
notícia.
25.Mar.2015
Martins
Júnior
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