Deixando para trás
algumas peças inacabadas desta minha folha dos dias intercalares, retomo a
meada última, a propósito da tempestade com que o nosso governo “imberbe” ia levianamente varrendo a quietude da população da Ribeira
Seca e da anónima maioria pensante de Machico. Ainda bem que as crianças do
sítio não serão forçadas a abandonar as amplas salas de aulas que seus pais e
avós conquistaram a pulso, desde há quatro décadas. Já não serão “emigrantes”
na sua terra natal. Bastou o pequeno sopro advindo da meteorologia funchalense
para que os pais e encarregados de educação se pusessem em campo e, assim,
ficasse anulada a guia de marcha subscrita nos gabinetes executivos. Parabéns
para as bases e para as cúpulas.
Sem menosprezo da
problemática que a baixa natalidade implica na economia dos espaços escolares
já construídos, há um “enorme pormenor”
a juntar aos argumentos que desaconselham as medidas preconizadas pelo governo.
Refiro-me à matriz vocacional dos edifícios escolares. Uma escola não é um
depósito indeterminado para onde se atiram quantas crianças ou jovens lá
couberem. As paredes de uma escola são um corpo vivo: são cabeça, tronco e
membros de uma comunidade. Lá se aprende a ler, contar e escrever. Mas muito
mais do que isso. A escola tem uma refracção pedagógica e uma função
sociológica inestimáveis, pois dela emana uma onda purificadora da atmosfera,
construtora de mentalidades e laços intergeracionais, com saltitantes vozes
infantis nos recreios, como pássaros a chilrear, cânticos e peças teatrais nos
palcos, nas festas, enfim, tenras espigas de trigo louro emergindo da terra que
habitam, para gáudio dos pais e primavera dos que vão tombando nos outonos da
vida. Sempre que possível, não desenraízem as crianças do meio ecológico a que
pertencem.
Um outro apêndice paira no
ar e, ao que parece, com tendência para ficar: a alteração da nomenclatura da
“Escola da Ribeira Seca”. Querem apagar o bilhete de identidade original para
lhe dar o nome de um pai incógnito no sítio. E pergunto-me o que sempre me interroguei nos
idos anos da luta política (que não partidária): Que estranho instinto o destes
governantes que os leva a fazer o que o eleitor não pediu e recusam-se a fazer
o que ele exigiu? Quem é que pediu ao sr. governo para riscar à Escola da
Ribeira Seca o nome da terra onde nasceu? Preguiçosa devoção de baptizar e
rebaptizar! Ao menos, consultaram os munícipes ou seus legítimos procuradores para
esse efeito? É o mínimo que fazem as autarquias para atribuir nome às
ruas, caminhos, becos e veredas, nos
termos da lei. E se e quando a jurisdição das escolas passar para as Câmaras
Municipais?... Novo baptismo, novas alcunhas? Mau gosto e mau senso!
Já aqui me debrucei sobre
a paranóica generosidade do anterior governo em deixar aos defuntos secretários
o testamento-epitáfio em escolas, centros de saúde, etc.. E também referi o
foguetório de pouca dura que o fascismo mandou para o ar quando retirou a
nomenclatura “Estádio dos Barreiros” para “Estádio Marcelo Caetano”.
Actualmente seria interessante saber (e aqui vai o repto para algum
subsecretário estagiário) quantas tabuletas andam por aí perdidas, embaciadas,
caiadas, rebocadas, em muros, entradas e
saídas de hotéis, escolas, centros cívicos, supermercados, tavernas e até
igrejas, com esta certidão de narrativa incompleta: ”Inaugurado por Sua
Excelência o Senhor…” , nem é preciso dizê-lo? Um bom trabalho para o(s)
historiador(es) do regime. Ridícula saloiice de parecer o DDT, o Dono Disto
Tudo! Estou a lembrar-me do satírico
cultor dos versos alexandrinos, Guerra Junqueiro, na Velhice do Padre Eterno, referindo-se aos novos clérigos tonsurados
com uma coroa a meio do couro cabeludo, dizia: “Já está assinalado com a marca
industrial da casa: zero”.
Senhores, respeitem a
pureza genesíaca da terra-mãe onde se levantam os laboratórios sociais e
culturais ao serviço dos seus povos. E, mais uma vez: Façam o que o Povo exige
e deixem-se de mexer naquilo que o Povo não vos pede.
19.Jun.2015
Martins Júnior
Muito bonito este texto. A Ribeira Seca-Machico tem sempre pronto e afinado o seu "microfone" .Está sempre ligado à rede dos problemas da localidade. Bem Haja, Padre José Martins Júnior, grande abraço
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