(Foto: Facebook da Câmara Municipal de Machico)
Ontem à noite foi a
véspera: alinhei e aplaudi as romarias,
as da cidade de Machico, as outras e a nossa,
com a marcha original do “ S. Pedro
da Ribeira”, leia-se, Ribeira Seca. E as de Câmara de Lobos, da Ribeira Brava,
da Póvoa de Varzim, enfim, de todos os cantos e ruelas, por onde os arcos e os
balões soltavam foguetes de alegria em “louvor do S. Pedro”, mas que, feitas as
contas, o destinatário eram os foliões e as respectivas claques.
Hoje, 29 de Junho, foi o
dia de andar com o Simão Pedro, na sua casa, no “calhau” do mar de Tiberíades, no meio da companha do barco onde
foi arrais, nos caminhos da Palestina, no monte Tabor, no Jardim das Oliveiras, até aos tribunais do
Sinédrio e ao cadafalso da crucifixão. É sempre assim todos os anos: ando com
ele. E foi aí que um dia descobri o fundamento de chamarem a Pedro um dos “Santos Populares”. Enquanto a multidão
acha-o popular pela folia da véspera, muito participada e divertida, descobri a
extensão semântica do termo “Popularidade”.
Popular é tudo quanto
--- pessoas, paisagens, objectos,
sensações --- se assemelha com o povo, que lhe está próximo, que se parece com
ele. Ao passar o dia com Pedro, vi "claramente visto” que é ele o
protótipo, o auto-retrato de cada parcela da identidade popular. Porque?
É vê-lo,, marinheiro
rostudo, destemido no mar e frágil em terra,
operacional e indeciso, fogoso e tímido consoante a circunstância,
enfim, o coração sempre ao pé da boca,
capaz do melhor e do pior. Ele é a personificação da bipolaridade estrutural
que enforma a psicologia popular e domina a condição humana, na sua
transparência e na sua transcendência: estátua de bronze e pés de barro.
É um estado de alma o que
hoje vos trago: intimista mas, ao mesmo
tempo, propulsor de energias sempre cadentes e sempre renováveis.
No rasto das “Sandálias
do Pescador”, encontramo-lo ao lado do Mestre, disposto a tudo para defendê-lO,
ao ponto de puxar do navalhão de cortar atum e desancá-lo na orelha de um dos
soldados que vinham prendê-lO nessa
fatídica noite de Quinta-Feira, que culminou no assassinato de Sexta-Feira. Mas
--- Oh paradoxo deste estranho mix, corpo-espírito
--- daí a poucas horas, quando Pedro, clandestinamente a aquecer-se junto à
fogueira, entre os judeus, nessa noite fria,
foi interpelado por uma mulher:
--- Tu também és do grupo d’Ele
--- Não sou, não, mulher.
--- És sim, até já te vim com Ele.
--- Não sou, estou-te a dizer e digo
quantas vezes quiseres.
--- Ah, já te descobri pelo sotaque
da terra d’Ele: és galileu.
--- Juro-te, mulher, nem sequer
conheço esse homem. Nunca O vi na vida.
Bastou que o Mestre
saísse da audiência do tribunal, cruzou com Pedro. E este corou de vergonha:
Três anos a conviver com Ele, escolhido para líder do grupo, acérrimo defensor, capaz de dar a vida por
Ele… e ali, diante de uma judia anónima,
borra-se de medo e comete a suprema traição que se pode fazer a um amigo: ”Nem
sequer o conheço”!
O resto já o sabemos. Das
muitas vezes que foi preso, açoitado e intimado a não falar mais do Mestre em
público, ripostava: “Vou continuar a falar d’Ele”. Até que, finalmente
sentenciado à pena máxima, pediu ao algoz
que o crucificasse, mas de cabeça
para baixo: “Não sou digno de morrer como o meu Mestre, porque O traí”.
Aí está Pedro, o espelho
de cada um de nós! Parecido connosco,
que somos capazes do melhor e do pior. Quantas vezes, o medo de afrontar
directamente a adversidade, o calculismo da nossa defesa individual, a preferência
pelo nosso interesse, se transformam em cobardia perante uma circunstância
fortuita!... Em Pedro, consubstanciou-se, “avant la letre”, a constatação de Ortega y Gasset: “O homem é
aquilo que é, mais a sua circunstância”. Na política, nos negócios, na religião! No
indivíduo e na sociedade!
Pedro --- tão perto de
nós, tão igual a cada um de nós, tão gigante e tão pigmeu como a massa de que
somos feitos. O nosso auto-retrato, o teu e o meu.
O importante é prosseguir
viagem, reagir. E tornar cada vez mais renováveis as energias cadentes da alma
popular. Como o “Homem do Leme” na
“Mensagem” de Fernando Pessoa . Como Pedro, o último e mais popular dos santos deste Junho de verão
nascente!
Será
esta a marcha, esta a canção que
ele mais espera de nós, como refrão perene da euforia da véspera.
29.Jun.2015
Martins Júnior
Mas Pedro quando negou à criada já tinha bebido o vinho do "Avô" ou da "Avó" , após ter renegado o poder durante 17 anos. Não é Pedro nem "Cefas" algum simão lá para o norte da Madeira. Finalmente, regressa, totalmente, igual a "Ulisses" não como o grande "Abraão", totalmente descarecterizado. Homens que voltam tal se ausentaram , não têm a minha admiração. É pura invenção. BOA TARDE!
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