“Até
ao lavar dos cestos é vindima”. Por isso, antes que termine a vindima de outono e não obstante a multiplicidade de
acontecimentos que nos batem à porta, vou hoje recolher alguns bagos de uva das
latadas da diocese, dado que ainda estamos na repisa desse notável e notando marco
da história da Igreja portuguesa, neste caso, a da Madeira.
Trata-se
da tal visita “Ad limina apostolorum”, ou seja, em termos concretos, da
prestação de contas ao Papa de Roma sobre o Estado da Fé e respectiva vivência
no território de cada região, em Portugal, acontecimento cíclico que se realiza
de cinco em cinco anos. É interessantíssima, porque envolta numa aura de misticismo, a forma como a comunicação
social afecta à religião se lhe refere: ”Contacto com as origens e fontes apostólicas, nos túmulos e catedrais de
Pedro e Paulo, Assembleia do colégio apostólico em redor do sucessor apostólico
de Pedro, ardor apostólico para reavivar a chama da fé” e demais sinónimos de
fideísmo e apostolicidade.
Mas
a verdade é que de nada sabe o Povo, digamos, os súbditos desconhecem por completo
a radiografia que deles levou o chefe diocesano ao Chefe universal e Juiz da Cristandade. Já por
aqui deambulei, antes do início da grande viagem que fez o episcopado a Roma. Hoje, proponho e reforço a necessária (assim
deveria sê-lo) interpelação a quem de
direito: Que respostas, sugestões, decisões, talvez sérios avisos mereceu o Relatório
apresentado em Roma entre 6 e 12 de Setembro?
Ninguém
sabe. E o mais significativo é que poucos ou nenhuns querem sabê-lo. E com isto
se toma nas mãos o barómetro da vivência cristã, cultural, social, parte
integrante da nossa história actual. Não há nada mais temível que a
indiferença. É o sintoma infalível de um corpo inanimado (mesmo que ricamente
perfumado e embalsamado) neste caso, de uma cristandade desencarnada, de um “faz-de-conta”, pois aí o que conta é a
fachada do prédio, o repicar dos sinos, as opas vermelhas embandeirando as ruas
e o pálio de oito varas arvorado ao vento.
É
um dado inquestionável que o barómetro da crença não marca a temperatura da espiritualidade.
A Fé não é mensurável. Mas… é caso para perguntar:
Que foram então fazer ao Vaticano os
nossos líderes religiosos? Se os próprios metem no congelador da memória
particular o que a todos diz respeito é sinal de que lá metem também a nossa
memória colectiva. Com que propostas e
com que ânimo regressou o responsável da diocese sobre o presente e o futuro da
catolicidade madeirense? Neste capítulo remeto os meus interlocutores para o eloquente
texto, histórico, que o Padre José Luis
Rodrigues publicou, precisamente no dia em que começou a magna assembleia em
Roma, domingo, 6 de Setembro. Lá estão as rubricas, os artigos e os parágrafos
para um Relatório, digno deste nome, a apresentar em Roma. Tê-lo-á sido, de
verdade? Ou tudo não passou de mais um roteiro turístico pago pelos
contribuintes das igrejas locais?!...
Estou
a recordar-me do veterano missionário redentorista, Le Père Henri Le Boursicaud,
que empreendeu, aos 75 anos, a corajosa
viagem entre Paris e Roma, no ano de 1995,
“percorrendo
1.500 Km, a pé, ao longo de estradas
nacionais de França e Itália, 97 dias a caminhar ao calor, à chuva, ao vento,
comendo e dormindo mal”. E para quê?... “Para
interpelar a Igreja Institucional”, assim define claramente o livro da viagem, já na sua 8ª edição. Foi com um misto de
emoção e militância que muitos de nós ouvimos contar, na primeira pessoa, o
relato desta autêntica viagem
missionária, quando o então octogenário (hoje com 95 anos) celebrou no templo
da Ribeira Seca e em vária igrejas da Madeira.
Interpelar
a Igreja Institucional de Roma!
E
o nosso prelado, terá ele ido interpelar ou --- o mais previsível --- terá sido
ele interpelado pelo Papa Francisco
acerca da Igreja institucional desta diocese?!...Respostas que os cristãos, atentos e responsáveis construtores da sua Igreja, têm o direito de saber. Onde está o Laicado
madeirense, os movimentos associativos, as ordens e congregações religiosas, o
Conselho Presbiteral, o Cabido dos cónegos? Ninguém esboça a mínima apetência para conhecer
o quadro geo-religioso --- ao menos aquele que foi apresentado em Roma ---
acerca desta nossa Ilha de Santa Maria?
É
uma proposta que aqui fica. Ainda vamos a tempo, porque “até ao lavar dos
cestos é vindima”. E alguém terá de exigi-lo! É um direito. Para estímulo do
dono da vinha, ouso alvitrar o seguinte: quem mandou elaborar “500 anos da diocese” bem pode mandar publicar 5 anos do seu episcopado.
21.Set.2015
Martins Júnior
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