segunda-feira, 13 de junho de 2016

OS DOIS “FERNANDOS” DO 13 DE JUNHO: QUAL DELES O MAIOR?!

 

Em 13 de Junho, olhar a cidade entre a colina do Castelo e a de Santa Catarina, ao Camões, alguém nos prende desde o miradouro da História e interpela-nos de viva voz: “Estamos Aqui”!
“Estamos”. Os dois Fernandos: um, nascido em 1188 (1191/1195?)  outro, em 1888. Este, Fernando Pessoa. Aquele, Fernando de Bulhões, por parte da mãe, (descendente de Godofredo de Bulhões) ou Fernando Martins, por parte do pai Martim.
Fico de pés cravados ao vão dessa ponte, maior que a de Vasco da Gama, a ponte de sete séculos que os separa e nos une no deslumbramento de quem pisa o solo que eles pisaram e onde deixaram pegadas de oiro e luz até hoje e até sempre.
13 de Junho! Morre Fernando, o Primeiro, que tomou o nome de António de Lisboa ou de Pádua. E nasce Fernando, o Segundo, “o enigma em pessoa”, na designação que lhe atribuiu o poeta e crítico brasileiro Frederico Barbosa.
Quem não ficaria emocionado, em mística levitação, ao passar, como hoje estou passando,  junto à Sé de Lisboa, na capela que lhe deu o título, lugar onde nasceu Santo António e, mais adiante, no Largo do Chiado, em cuja Igreja dos Mártires Joaquim de Seabra  Pessoa e D. Maria Magdalena Pinheiro baptizaram aquele que viria a ser “o mais universal dos poetas portugueses” e lhe puseram o nome original do santo taumaturgo – Fernando.     
Dois génios do pensamento, da palavra, das profundezas da condição humana! Mais que todos os monumentos, mausoléus, esculturas e altares, eles irrompem das pesadas lousas marmóreas e erguem-se, majestosos arcanjos tutelares da Pátria, abraçando no Atlântico todos os mares e continentes. Só em pensar que foram eles -  e continuam a ser – os inquebráveis satélites que hasteiam pelo mundo fora a bandeira de Portugal e vencem nebulosas seculares, só em pensar nisso, deixa-nos extasiados de prazer e poesia.
Qual deles o maior?- interrogo. E… qual deles o maior! – exclamo.
Hei-de dedicar algum dia o melhor esforço para descobrir em cada um deles traços de identidade mútua, porque neles se personifica o velho aforismo: muito mais é o que os une que aquilo que os separa.
Tal como o próprio Mensageiro Fernando cantou de D. Filipa de Lencastre – “que enigma havia no teu seio que só génios concebia”? – assim também, de Lisboa perguntarei: Que segredo houve no teu terro, que princípio activo, denominador comum, te fez produzir duas almas gémeas e gigantes, unidas pelo cordão umbilical de sete séculos de História?! 
Por hoje, além da coincidência de dois espíritos irrequietos, viajantes de continentes, apenas sintetizarei o percurso intelectual de Fernando de Bulhões e de Fernando Pessoa. Na obra do primeiro, António de Lisboa, cultor e investigador da natureza, desde os animais terrestres aos marinhos, vejo-o reproduzido no “Guardador de Rebanhos” de Alberto Caeiro. Pelo conhecimento da antiguidade clássica, greco-romana, os seus filósofos e estetas, aproximo-o das Odes de Ricardo Reis. E pela visão emancipadora da nova sociedade medieval, em que António de Pádua combateu a prepotência especuladora dos mais ricos, saindo vigorosamente em defesa do campesinato, os proletários de então, descubro aí o mesmo verve  interventivo de Álvaro de Campos.
Irmanados pelo “13 de Junho” e aproximados na tumba (nenhum alcançou o meio-século de idade) a ambos agradeço esta celebração interior, em contraponto ao bulício superficial das Festas Populares, “com que o vulgo néscia se engana” ou, ao menos, deles se esquece.
O funeral do amigo Paquete de Oliveira protagonizou-me este reencontro com o outrora e o amanhã, pelas mãos dos dois Fernandos imortais.

 Lisboa, 13.Jun.16
  Martins Júnior  

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