Está
ao rubro toda esta Europa, desde o sul
que habitamos, com as eleições quentes de “nuestros hermanos”, domingo
próximo, passando depois pela França, feita o enorme caldeirão do campeonato
europeu, até ao norte, o Reino Unido, onde o embate Brexit- Remain põe em
ebulição a fleugmática tradição do povo britânico.
Após
a sucinta análise do meu último escrito, hoje vou colocar no pódio
civilizacional da coragem e da coerência
um gesto que ontem inundou todo o velho continente, como um estranho rio que
sobe da foz para a nascente. Veio de Roma e desaguou nas margens do Tamisa!
Sei
que quando for lida esta página já estarão cá fora os foguetes de um ou outro
arsenal, o Brexit ou o Remain. E por não saber ainda os
resultados desse referendo, ainda mais força ganha o gesto que a gravura
regista. É que de todos os quadrantes politico-económico-ideológicos têm
surgido conceitos e juízos sobre a saída ou a permanência do Reino Unido na
grande família europeia. Na balança dos argumentos acumulam-se muitas
variáveis. Cada instituição releva-os ou renego-os, consoante os interesses
corporativos das respectivas instituições. Entre a vaga do argumentário há um
pico forte que espalha o medo e acicata as reacções do mais cego populismo – a imigração,
os “perigosos” imigrantes. É patente o vendaval de xenófobas imprecações com que os agitadores içam a bandeira do Brexit para cortar com a Europa Unida.
No
meio desta “babilónia das gentes”, faltou uma voz – a das instituições
religiosas. Todos sabemos que estas ficam à beira da picada, mudas,
calculistas, sem se comprometer com ninguém, alegando que os pregadores da
religião não se devem meter na esfera da “política”, mas após a refrega correm
depressa a dormir na alcova do partido que ganha. Como os puritanos fariseus,
voltam a lavar as mãos na bacia de Pilatos, cientes que assim comem do seu e do
alheio. Nem me demoro em demonstrações, de tão evidentes e despudoradas elas
são, mesmo à nossa porta.
Mas
houve alguém que disse não. Proclamou-o ao mundo, não com discursos fúteis, mas
com um gesto oportuno e histórico, na sequência de anteriores atitudes e decisões já assumidas
no terreno. Querem ostracizar os imigrantes, a pretexto de egoística soberania?
Então aí vai, de novo, brandindo em campo aberto seu flamejante exemplo, Francisco Papa, em
Roma, precisamente na véspera do referendo-ultimato inglês: “Um cristão não
pode nem deve fechar a porta aos irmãos refugiados”. O jovem quase-octogenário
caminha com eles na Praça de São Pedro, fá-los sentar-se ao seu lado nos
degraus do altar e dali lança para todo o mundo o “foguetão” libertador do seu
aviso – o seu veredicto - esperando que, ao sobrevoar os céus de Londres,
saiba o seu povo acolher e abraçar quem
lhes pede socorro e assim faça jus ao título milenar que ostenta desde
a sua fundação: Reino Unido!
Poderia
o bispo de Roma acomodar-se, aconchegar a sotaina aos joelhos e balbuciar com
santa unção: “Não me meto nisso, até porque amanhã há o Brexit”. Mas não! Com a penetrante visão da águia vigilante,
levanta voo e brada: “Agora é que é a Hora”!
Seja
qual for o resultado, aí fica o gesto memorável, espelho e estímulo para todos
os que recusam a comida dos corvos e abutres! Todos os que sobem a montanha da coragem e alcançam o cimo da coerência.
23-Jun.16
Martins Júnior
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