Fechou-se mais um ano lectivo.
Abrem-se agora dois meses livres de horários, de monótonas campainhas. Mas dois
meses, também, de preparação para novo campeonato. Portanto, é neste
descontraído teleférico entre um ano e outro que nos dá para olhar e monitorizar
a grande e sinuosa paisagem da Educação.
Permitam-me
colocar na tabuleta desta minha reflexão
aquele sábio axioma de outros tempos. “Para educar uma criança é preciso uma
aldeia inteira”.
Ao
falar da “aldeia inteira”, situo a Escola na sua omnímoda dimensão: o local, o
ambiente social, a família, as instituições, enfim, o habitat ecológico do
educando. Sem a conjugação de todos estes ingredientes, dificilmente sairá uma
criança segura, auto-confiante, receptiva ao conhecimento, numa palavra, uma criança educada, na completa acepção do
conceito. Porque a Escola não pode reduzir-se a uma “loja de atacado” ou a um
depósito de embrulhos, hipocritamente rotulados de “as nossas crianças”.
Nem
de propósito, hoje na imprensa diária, o abalizado mestre da arte de ensinar
(educar), o Prof. André Escórcio, em consonância com o presidente do Sindicato
dos Professores da Madeira, insistia (como de resto faz nos seus escritos) na
necessidade de “melhores condições de trabalho e na maior aposta no
acompanhamento do aluno”, constatando que “nas turmas em que podemos fazer um
trabalho concreto e individualizado temos bons resultados e reduzem-se as taxas
de reprovações”. E conclui que é urgente
“questionar as razões substantivas do insucesso escolar no enquadramento organizacional e pedagógico”.
Agora
sou eu que sublinho: “condições de trabalho … acompanhamento … trabalho
concreto e individualizado … razões substantivas … enquadramento organizacional”.
Aqui está a síntese de todo um tratado objectivo, porque experiencial, do
sistema educativo. Entram nesta súmula as mais amplas coordenadas conducentes
ao sucesso na Educação.
Da
minha parte, vou incidir a reflexão que se impõe face ao dilema com que pais e
alunos se confrontam neste momento crucial de transição: a fusão de escolas. Assentados
nas poltronas dos gabinetes, os especialistas em autópsias sociais cortam,
recortam, entortam até às costelas o corpo e a vida de crianças e adultos. Por
instinto exclusivamente economicista, dividem o organismo social, de régua e esquadro em cima do tabuado,
insensíveis àquilo que mexe e faz sofrer não apenas pais e filhos, mas toda a arquitectura
da Educação. Fazem das crianças embrulhos descartáveis em cima de contentores e
atiram-nas para onde virarem os ventos da incompetência governativa.
Se
um dia pais e filhos e educadores entrarem pelos gabinetes assépticos, gritando
que não são os prédios que arrastam as crianças, mas são estas que determinam e
dão sentido às construções escolares – dirão eles que se está diante de uma
revolução de arruaceiros analfabetos. E, de ricochete, ouvirão a resposta:
Analfabetos, esquartejadores sois vós, que roubais “as turmas, as condições de trabalho, a aposta
no acompanhamento escolar”, enfim, desenraizais de suas famílias e da sociedade
envolvente as crianças desde a mais tenra idade!
Amputais do “habitat” do seu crescimento natural a infância carente da proximidade inter-geracional
para encaixotá-la em monstruosos paredões, descaracterizados,
despersonalizados, enchouriçados. De muros gradeados em volta, mais parecem
prisões que sedes de Educação, onde fermentam como larvas os complexos da
anomia na psique de quem se sente como um estranho. Na sua escola de origem,
tinham pátios de recreio, campos de jogos, amplos espaços de lazer.
Não
menos censurável é a desertificação a que
ficam condenadas as zonas altas, olhando para a sua antiga escola como quem tem sempre diante
si um cemitério de crianças varridas do seu berço. Quem pode suportar tamanha
cegueira, senão mesmo, tão desumana crueldade?!... As estradas que fizeram
tanto trazem como levam. As grandes superfícies comerciais, os centros de
saúde, os equipamentos desportivos e culturais, as delegações bancárias, as
repartições públicas, os correios - tudo
está previamente delineado para a debandada das populações. Só lhes restam a
igreja e a escola. Mas, agora, nem a escola!... A pouco e pouco, desenraízam quem
aqui nasceu e tem amor à terra-madre dos seus antepassados. E lá vêm depois as
mágoas das carpideiras dos gabinetes da capital sobre a “lamentável” desertificação
dos meios rurais… Grandes trastes!
Voltarei
a este assunto até que as mãos me doam.
Mas não podia deixar passar
em claro esta afronta à Escola, precisamente hoje, 7 de Julho, Dia
Internacional da Educação. Um grande Salvè a todos os homens e mulheres
que abraçaram a nobilíssima missão de Educar!
07.Jul.16
Martins Júnior
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