O
meu olhar desta terça-feira vale tanto como o seu contrário. No colorido
estádio das opiniões, todas as bolas e todos os chutos valem, mesmo que não
acertem no alvo. Cada qual é árbitro de si próprio. Foi neste relativismo,
sempre discutível, que anteontem me
atirei ao relvado, timidamente, com a alegoria do presépio e da manjedoura
transplantados para o rectângulo onde vinte e dois “pastorinhos” e três “reis
magos” correram, lavraram, espernearam até mais não poder.
Mas
hoje, a timidez deu lugar à coragem. A curiosidade - ou a atenção - que me dispensaram os amigos,
companheiros ‘blogers’, incitou-me ao desabafo que pensava curtir só comigo
mesmo. E lá vai, sem mais preâmbulos:
Foi
ontem Dia Grande para todo mundo português. Porque dois portugueses encheram o
mundo inteiro de prestígio e de esperança: António Guterres e Cristiano Ronaldo.
Um, CR, guardou, pela quarta vez, na mão
e no bolso o merecido esférico de melhor futebolista do planeta O outro, após longa caminhada entre os excluídos
e exilados, subiu ao topo do mundo para
tentar transformar as lavas da guerra no
ouro da paz. Um saiu do chão da pobreza e alcançou as galas do “Jetset”. O
outro, oriundo dos divãs do bem-estar e
das cátedras da Faculdade, desceu aos antros da miséria humana, “sujando as
mãos na lama da pobreza”, como um dia se dirigiu corajosamente Francisco Papa aos
seus correligionários.
Numa
escala de valores, qual deles o maior?!
É
aí que salta o vigor, senão mesmo a cegueira, do relativismo. Cada qual tem a
sua escala. Na geoestratégia dos tempos que correm, um dos ‘galardoados’ tem o “rectângulo verde” como se fosse o mundo todo. O outro tem por seu rectângulo de acção o mundo inteiro, de
todas latitudes e longitudes, com a “missão
impossível” da quadratura do círculo.
Os
jornais generalistas de Portugal Continental, consoante o seu padrão
valorativo, deram o destaque in contornável às duas personalidades, puxando
para primeira página a feliz notícia, com registo fotográfico assinalável. É da mais
elementar interpretação jornalística inserir na primeira página os valores fundamentantes
do respectivo periódico. Porque é no rosto, mais que nos interiores, que se define a publicação e é com esse
impacto visual que pretende formatar a
opinião pública.
Sem
mais comentários - que os deixo a quem quiser desenvolver o caso – devo dizer
que foi com repugnante surpresa que avistei os nossos dois jornais diários,
cada vez mais iguais, apagarem liminarmente da primeira página o actual
Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, na cerimónia do Juramento
Solene, em Nova York, com a presença do Presidente da República e do Primeiro
Ministro de Portugal, ao lado dos representantes de todos os países membros.
Foi
Nietzsche quem teorizou que ”o importante não é o acontecimento mas a sua
interpretação”. Pelos vistos, aqui não é
Portugal. Como madeirense e português, sinto-me lesado e envergonhado. Mas se acaso querem puxar pelo bairrismo ilhéu,
relevando os que fizeram bem à Madeira – mais que só por isso não fosse – a memória
escasseou aos publicitários, esquecendo-se que foi o Primeiro Ministro António
Guterres, quem perdoou aos madeirenses a
colossal dívida de 110 milhões de contos, (550 milhões de euros) numa época de
crise fatal para as finanças regionais.
O
que mais conforta é saber, como Charles Péguy, que “o jornal de ontem já é mais velho que a ‘Odisseia’ de Homero”.
13.Dez.16
Martins
Júnior
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