quarta-feira, 29 de março de 2017

DE DEMOLIDOR DE PONTES A DESTRUIDOR DE IDENTIDADES


É um ‘não-assunto’ que hoje vos trago. E sem vontade. Precisamente por isso: por ser um ‘não-assunto’. Mas já que se mexeu nos alicerces de Portugal e se empurrou meia ilha para o ‘não-assunto’, eis-me aqui a transformá-lo em assunto do dia. Aliás, já me dei conta do seu parto deleitoso na acta-rábula que o SENSO&CONSENSO publicou em 03/01/17 , para cuja leitura convido os meus amigos.
Dois sinais de trânsito quero colocar à entrada. Primeiro: viva o maior jogador do mundo do futebol, nosso conterrâneo. Segundo: o ‘corajoso’ inquilino da Quinta pode pintar a casa e o roseiral  da cor do craque, pode tatuar-se  da cabeça aos pés do mesmo jeito. Que até fica jeitoso. Mas o que não pode é carimbar assim a ilha secular e obrigar-nos todos à mesma tatuagem, concebida numa noite luarenta e fumacenta na inauguração de um solar do craque.
Quanto ao mais, poucas palavras, mas as suficientes.
A Madeira encolheu e o portador da Taça perdeu. O que antes abarcava um enorme colectivo agora espremeu-se num busto irrisório. Para apresentar a Madeira e reduzi-la a um  par de chuteiras - é preciso ter tanto de ‘coragem’  quanta a miopia de senso. 
Por sua vez, o craque perdeu. E perdeu, porque dele só se ouviam aplausos, vivas, “não há outro maior que o homem das bolas de ouro”. E agora, estragaram-lhe o nome,  obrigaram-no a trepar abusivamente  um pódio que não era o seu, espetaram-lhe a cara no beiral do aeroporto, onde fica ali suspenso, sumidinho. “Cada macaco no seu galho” – comentava-se – e o dele não era aquele. E ele sem culpa nenhuma. E quando a ‘oposição’  dos ventos cruzados chutar para fora os aviões que querem entrar, lá estarão as femininas vozes dos altifalantes moendo a paciência: CR fechado, CR aberto, CR cancelado e outros mimos. Podiam poupá-lo a esta tortura.
CR7 é grande – com ou sem a Madeira.
E a Madeira é maior – com ou sem CR7.
São de um raro preciosismo os novos nossos governantes. É tal a sua originalidade que não fazem o que o Povo pede e tão depressa fazem o que o Povo não pede. Pergunta-se: “Foi você que pediu um apêndice no pescoço do aeroporto”?... Porque o que lá está não passa de um remendo mal deitado no colarinho da aerogare.  Ao menos por coerência, senhores, fizessem  algo de imponente e vistoso, como quadra ao “homenageado à força”. Enfim, coisa de saloio… E abalam-se as estruturas do país – Presidente e Primeiro Ministro – para um improvisado e teimoso carnavalinho de feira, a que não faltou um bodo aos pobres espectadores, sobretudo criancinhas às centenas, fora das aulas, em feriado também obrigatório.
De demolidor de pontes a destruidor de identidades –   titulei este ‘não-assunto’, da autoria do novo chefe da Quinta. Deixe a Madeira em paz no frontispício do nosso pórtico primeiro. Ela é a nossa identidade genesíaca. Ela é maior e mais bela que qualquer um dos seus filhos! Quem sabe se, pelo mundo inteiro, virão reis do oriente e do ocidente, coreanos e lapões, em busca da “ilha CR7” e, por engano, ao aterrar, descobrirem que é a Madeira?!...
Não chega. Mas fica-se por aqui. Porque o “histórico feito” não passa de um vulgar ‘não-assunto’.  Só faltou ensaiar aos meninos (graúdos e miúdos) o hino da Mocidade Portuguesa dos velhos tempos em que o mudaram o “Estádio dos Barreiros” para “Estádio Marcelo Caetano”:
“Lá vamos cantando e rindo
Levados, levados, sim”
Levados, mas não todos. Eu também não.
         E quem pensar de outra forma tem também o seu direito.

  29Mar17
Martins Júnior
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