ACTO
I
Do princípio ou do fim
Um sopro o trouxe do outro mundo
E logo os rios correram para norte e o
mar do fundo
Subiu às nascentes doces da montanha
O balido das ovelhas
Aqueceu-lhe o berço de uma Glória
estranha
Vieram vagabundos párias sem abrigo
Vieram mulheres do ofício mais antigo
Náufragos dos Cabos das Tormentas
E de todos os mediterrâneos
Os do lixo humano e os
Olhos sedentos de Sol e de Esperança
Das ilhas-longe que a vista não alcança
Também vieram reis
Rainha de Sabá foi a primeira
Teceu-lhe de ouro a passadeira
Para esconder espinhos e adoçar quebrantos
Que na véspera lhe servira à mesa
estreita
O Velho-Menino a todos abraçou
Na praça universal
O sorriso terno de avô
Vestiu de infância
O mármore frio e morto
Das pálidas estátuas da distância
Finou-se o longo tempo da espera
Ao mundo enfim chegara a Primavera
ACTO II
Mas os muros solenes soturnos
Do império sem pássaros nem buganvílias
Rangeram nos escombros
Abutres de fino escarlate
Demónios asados como anjos em secreto
Lavraram o satânico decreto
‘Venha um Judas que o mate’
Trinta dinheiros de trinta milhões
E outros mais
‘Temos os bancos prenhes de canhões
De ouro e de sangue
Branqueados de orações’
Lado a lado à mesma ceia
Do mesmo pão do mesmo vinho
São lobos em alcateia
‘Vamos depressa
Que amanhã é Sexta-Feira
ACTO III
Quem veio do fim do mundo
Traz o princípio a manhã
Em rebento sempre e sem ocaso
E o Velho-Menino afronta o Satã
Dos soturnos abutres
Ilumina o campo raso
Parte as lousas tumulares
Das fétidas ossadas
E traz de volta os argênteos ‘Bons Ares’
Que fazem abrir o sonho e as madrugadas
De novo o sorriso
De octogenária criança
É Páscoa toda a noite e todo o dia
De quem luta e nunca desespera
Por essa antiga e nossa Primavera
13.Mar.17
Martins Júnior
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