Domingo findo, o que dele fica é o olhar do observador atento à paisagem circundante. Hoje entrou-nos abertamente em casa e na rua onde moramos o acento forte do contraste. De um lado, a irrespirável intoxicação esférica que sai dos rectângulos verdes e toma conta dos ecrãs televisivos. Do outro, as labaredas gritantes que devoraram vidas: 66 - contam as folhas impressas deste domingo. Desde logo, o contraste entre o áudio-visual e a imprensa escrita.
17
de Junho 2017-2018 – a coincidência. A asfixia da bola – a dissidência.
Na
euforia estupefaciente da bola, alteiam-se os televisores até ao limite
estelar, com o estardalhar pirotécnico das praças russas, repercutidas em tudo
quento é nesga de Portugal. Acrescentem-se-lhe as piruetas e os delírios
infanto-maníacos de um moço abusivamente pintado de verde-branco, enchendo
palcos, puxando saliva da língua dos comentadores, entretendo plateias, numa requentada
comédia de enfados que já nem conseguem divertir-nos.
Que
estranha sensibilidade a nossa, que se deixa prender pelo efémero, pelo ridículo,
pelos ‘idiotas-úteis’ e, em repugnante contraste, passa ao largo da tragédia
que vitimou corpos e almas, gente como nós?!
Não
se trata de apagar com lágrimas de hoje o fogo devorador de há um ano.
Trata-se, isso sim, de construir mentalidades, adoptar critérios de valor e
estabelecer prioridades no pensamento e na acção. Para ajudar a clarificar os
contornos mais incisivos da contradição de valores, reflicto em três quesitos
fundamentais:
Qual a diferença de
orçamentos entre os faraónicos privilégios da bola mundial no que concerne a
Portugal e os prejuízos de pessoas e
bens de Pedrógão Grande?...
Quanto dão por um par
de chuteiras? E quanto custa uma vida, quanto pesam dezenas de vítimas tragicamente
ceifadas?...
Quanto aos efeitos - directos,
indirectos, colaterais – ponhamos na balança de julgamento e notemos os que
mais pesam no tempo e no espaço: se os da vitória/derrota no mundial, se os do
sucesso/prejuízo do 17 de Junho de 2017?...
Na resposta a estas três questões
fundamentais reside a escala de valores que nos faz observar e avaliar,
primeiramente, a estratégia dos órgãos informativos que nos batem à porta e, na
mesma linha, medir a sensibilidade dos portugueses perante os acontecimentos
ocorridos ou comemorados neste domingo. Aí revelar-se-ão evidentes, comprometedoras
e motivadoras as “coincidências…dissidentes”
da vida de uma aldeia ou de um país.
17.Jun.18
Martins Júnior
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