É
ela o último hasteio das nações – a Justiça. Quando tudo falha, quando já não resta
sequer lenho verde a que se agarrar no meio das ondas revoltas, os olhos do
indefeso náufrago da vida viram-se apenas para o rochedo firme onde habitam os “homens
da lei”. Nem reis nem presidentes nem executivos nem mesmo hierarcas das
religiões detêm um capital de confiança securitária como os juízes.
Mas quando são eles – os guardiões do
Templo da Justiça – a desvirtuar o seu próprio estatuto de fiéis julgadores,
então cai-se na anarquia: é o poder na rua, é o suicídio dos povos!
Aconteceu ontem mesmo: o Supremo
Tribunal da América decidiu, a favor de Trump, a proibição de entrada em solo americano dos
cidadãos provenientes do Irão, Somália, Líbia, Síria, Chade e Coreia do Norte. Após uma porfiada luta
que dura há mais de um ano junto de tribunais de primeira e segunda instância,
que indeferiram a pretensão do Presidente, surge agora o ‘Carrasco’ Supremo
premiando a fúria xenófobo de Trump. Como disse a juíza Sonia Sottomayor (que votou “vencida”) a
decisão do Supremo configura uma atitude “abertamente discriminatória contra
uma minoria religiosa”, numa frontal contradição à Constituição Americana.
Acresce que não há paralelo entre a
gravidade da sentença e a fragilidade da votação: foram cinco juízes contra
quatro. Por um só voto destruiu-se uma ingente “batalha legal”, todo um caminho de esperança e justiça
humanitária. Prevaleceu o partido político (o republicano) contra os direitos humanos!
Mísera e esfarrapada foi a declaração do juiz presidente John G. Roberts Jr,
quando recorreu ao aleatório argumento da “Autoridade Presidencial” ( a de
Donald Trump) para justificar a decisão. Não se fez esperar a reacção da
população americana em diversos estados, até à porta do Supremo Tribunal, em
Washington. A própria American Civic
Liberties Union, pela boca de um dos seus juristas, Omar Jadwat, não
hesitou em classificar a sentença como “um
dos maiores falhanços do Supremo Tribunal dos EUA”, idêntico às decisões de
outrora sobre escravatura, segregação nas escolas e encarceramento dos cidadãos
americanos de ascendência japonesa.
Transpondo este tremendo cenário para
outros quadrantes da vida das sociedades, a nossa incluída, solta-se-nos do
fundo do consciente este grito: “Para onde vamos, a quem iremos, quem nos
socorre”?... Quando a Justiça se corrompe e quando os julgadores ficam a soldo
da “Autoridade Presidencial” – e do capital – ninguém está seguro. É o regresso
à lei da selva.
Sinto hoje percorrer-me o corpo e o
espírito o travo amargo de um pessimismo visceral perante as vítimas de
sentenças injustas, de direitos denegados na barra dos tribunais e nos atalhos
da vida. Mas, ao mesmo tempo, agiganta-se-me um sentimento de indignação contra
os maus julgadores e, pior que eles, os maus legisladores com assento nos
parlamentos. O Povo tem de provar publicamente a legisladores e julgadores que,
precisamente por ser destinatário directo da Justiça, a sua voz sobrepõe-se à
força gratuita dos poderosos. Exemplos não faltam por esse mundo fora, como
recentemente aconteceu em Espanha. Mais
importante, porém, e eficaz serão os eleitores que, quando votarem, saibam
escolher quem lhes dê garantias de independência e humanismo.
27.Jun.18
Martins
Júnior
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