Contra
o atávico estigma que traz gerações acorrentadas ao cepo da pobreza e da
exclusão, venho bradar – Marchar, Marchar!!!
É esta a minha única saudação, de punho
cerrado e olhar vigilante, neste Dia Mundial para a Erradicação da Pobreza. Arrumo,
por hoje, na prateleira a interminável bibliografia académica sobre os casos,
as causas empíricas e as variantes desse grito deprimido e depressor para a
condição humana – a pobreza. Tenho ocupado o meu dia pendular entre os duas
estratégias de guerrear o monstro que se colou à pele e aos ossos da sociedade
em que nos habituámos a viver: uma, de carácter curativo e assistencialista, a
outra de decidida militância ressocializadora.
A
primeira conforta as mentes pusilânimes, direi mesmo doentias que, na sua
frágil boa-fé, correm como almas penadas para acudir às ocorrências pontuais de
quem estende a mão à caridade e à compaixão itinerantes. Tremendamente injusto
seria malsinar ou denegrir tantos gestos de apoio imediato a quem sofre à nossa
beira, carente de pão, de saúde, de amor. O problema é quando o provisório
passa a definitivo, pior ainda, quando o agente filantropo (ou por piedosa
devoção) faz desse gesto cirúrgico a obra-prima do seu programa existencial e
por aí se queda, feliz, realizado. Há instituições e respectivos figurantes cujo
esforço operacional não tem outro efeito senão o de manter a pessoa num
perpétuo estatuto de pobreza e dependência que se transmite de pai para filho
até à quinta geração. “Pobre uma vez, pobre para sempre” – é esse o anátema que
tais organizações, inconscientemente talvez, põem aos ombros de várias
gerações.
A
outra estratégia, essa de carácter dinâmico, resilientemente reprodutivo,
consiste em lançar a corda à vítima para que seja ela mesma a sair da fossa em
que caiu e reconquistar a autonomia
livre e construtiva. É o velho mas sábio método de “dar a cana em vez de dar o
peixe”. Ressocializar-se é incluir-se, é derrubar a inexorável bruxa da
exclusão. Assim como o estigma da pobreza persegue gerações, também a pedagogia da ressocialização leva gerações a
alcançar. Exige um olhar penetrante, contínuo, militante. Detectar os sintomas,
investigar as causas - as próximas e,
sobretudo, remotas – e “lançar o arco de
uma nova ponte” para a vida!
Exige
também coragem – cívica e política! Recordo-me de assistir durante décadas no
Parlamento ao ‘chumbo’ sistemático de uma proposta de “Criação de um
Observatório Social”, precisamente sobre esta problemática. Por isso, qual não
foi a minha surpresa quando recentemente li na comunicação social madeirense a
notícia do Protocolo celebrado entre o Governo Regional e a Rede Europeia Anti-Pobreza,
cujo objectivo alcança exactamente este desiderato: erradicar a pobreza nas
suas raízes (como define o próprio vocábulo) não pela costumeira via da subsidiodependência,
mas pela difícil e lenta auto-inclusão no tecido social envolvente. Ao seu presidente,
Padre Agostinho Cesário Jardim Moreira, (na foto) um bem merecido aplauso pela
iniciativa pioneira na Região e votos de sucesso nessa tão nobre quanto
hercúlea missão. Apreciei - e com isso me congratulo - a afirmação de
independência no pensamento e na acção, então proferida: “A pobreza não é de
nenhum partido”. Os madeirenses confiam e esperam.
17.Out.18
Martins Júnior
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