terça-feira, 5 de março de 2019

CADA QUAL SEU CARNAVAL – “MADEIRA CARNAVAL”… PRECISA-SE!


                                                         

Podia começar este breve apontamento, evocando         a velha canção de João Maria Tudela “E tudo é Kanimambo”, inspirada no folclore moçambicano. “E tudo é carnaval”, podemos assim fazer uma trupe representativa de todas as outras que há por esse mundo fora. E tudo é carnaval!... Cada qual procura o seu. Sábado passado, logo três – três carnavais puseram Portugal em alvoroço, de lés a lés: a norte, o perigoso tropel das hostes portistas-benfiquistas num desfile de alto risco., que galvanizou milhões de adeptos. A sul, a apoteose do Festival da Canção em surpreendente corso que siderou milhares de fãs. E, por último, o Rio de Janeiro inundando  as avenidas do Funchal para milhares de milhões em todo o mundo. É caso para confirmar: cada qual, seu carnaval. Porque tudo é carnaval.
Não esperava chegar a esta circunstância peculiar de organizar uma trupe de parágrafos nesta terça-feira de carnaval. Mas o facto é que estamos diante de uma realidade incontornável. Os corsos carnavalescos vieram para ficar. E é ver a azáfama, o empenho, a generosidade sem limites de uma multidão de voluntários que, nos bastidores do “teatro das operações”, dão corpo e alma para que a sua trupe seja a maior. E nisto vai a grande medalha de ouro para todos os foliões, do maior ao mais pequeno. Paralelamente, porém, a esta qualificação comunitária do carnaval, junta-se-lhe também todo um sistema de válvulas orgânicas e psicológicas que produzem esse néctar relaxante chamado catarse global.
No entanto, mandam as balizas da visibilidade crítica (no sentido mais positivo da expressão) olhar e “ver” a singularidade de certos estilos carnavalescos. Falo da singularidade (da que há e da que não há)  enquanto originalidade criativa, representativa da terra e do povo onde se desenvolvem os desfiles. Neste âmbito, o que mais se ouve dizer acerca do corso carnavalesco do Funchal é que, não obstante a sumptuosidade e a opulência do guarda-fato, pouco de original brilhou pelas ruas da cidade, mais parecendo um enorme tatuagem do sambódromo do Rio transposto para a estreiteza do Funchal. A indumentária (ou a falta dela), a plumagem maciça em todos os grupos, as repetidas coreografias, enfim, e a música – ai, o massacre das mesmas vozes cariocas, o plágio sem pudor dos mesmos  temas brasileiros. Seria caso para um sugestivo cartaz turístico: “Quer ver o carnaval do Brasil? Então não pegue o avião, tem-no aqui à sua porta”!
E o mais confrangedor (e talvez abusivo) é o já roído carimbo de 2019: os “600 Anos”. Em tudo quanto aparece à tona de água, - seja mato ou seja gente -  prega-se-lhe logo o selo oficial do baptismo: “600 Anos”.  O imponente cortejo do Funchal, nos moldes em que foi concebido, seria sempre o mesmo, acontecessem ou não nos seis séculos do Achamento da Ilha”. A bem da verdade, requerer-se-ia maior criatividade autónoma, marca Madeira.
           Esse toque de verdade local é nas zonas extra-Funchal, mais exactamente nas periferias, que encontra o seu habitat inspirador. E viu-se, nalguns casos, em que foi o povo da terra o protagonista do seu carnaval. Não eram vedetas (importadas, a peso de ouro), mas identificava-se bem a força telúrica, a entrega anímica, a alegria transparente no rosto de novos e idosos que desfilavam sem complexos. Um carnaval assim cumpre o seu lugar: descomprimir o ambiente e libertar as pessoas. É por isso que se põe em causa a participação das trupes da capital nos restantes concelhos e freguesias da Madeira. Se, por um lado, deixam nota excelente pelo brilho da indumentária e pela perfeição artística de uma coreografia profissional, por outro subalternizam os grupos  locais que não se pouparam a esforços, dia e noite, para brindar com galhardia carnavalesca a população residente. Finalmente – e outra vez – a música. Chega a indispor o mais incauto observador ter de suportar a “brasileirada batucada” (aqui pode usar-se o termo preciso, uma overdose), que lhe fura os tímpanos, de cada vez que passa uma trupe. Se me fosse permitido, ousaria propor aos patrocinadores   que, de futuro, não massacrem mais o público com estafadas canções de fora,  que já são sobejamente conhecidas. Em seu lugar, estimulem os organizadores à criação de músicas originais (assim se faz em Machico) que traduzam a autêntica cultura regional para que o nosso carnaval divirta, eduque e faça surgir os talentos que por aí andam e assim se reforce e engrandeça o “Carnaval, Marca Madeira”!

05.Mar.19
Martins Júnior




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