Vem
de longe a arte da prestidigitação, quer no teatro do palco, quer no anfiteatro
da vida. No primeiro, o gesto farto, espectacular de uma das mãos esconde a falácia
da outra, onde se aljava o truque, o tiro, a queda. No segundo, a mão dá lugar à
palavra, ao sorriso mefistofélico e aos tratados oficiais. E tudo serve – puxemos
atrás até encontrar o ardiloso “Cavalo de Tróia” – para iludir o interlocutor,
seja o indivíduo, o clã e a classe, a tribo ou a nação.
Supérfluo assinalar que é na política
que a velha arte nunca envelhece. Quando não se estampa no rosto, lobriga-se-a
no olhar e quando o discurso engana, os factos
denunciam,
por acção ou omissão.
Sem mais prolegómenos, quero trazer
aqui a ‘arte fina’ do dragão chinês na visita à vizinha raposa russa, aquele
enigmático e astuto – e, por isso, vencedor – esta primária e pós-czarina –
perdida a aristocracia dos czares e ressabiada do ultrapassado império
soviético. Do encontro, o que menos se sabe é aquilo, o mais importante, que se
passou nos dourados, sumptuosos salões do Kremlin ente Putin e Xi Jimping. Do
que transpira para o exterior – trocas comerciais, transportes, acordos vários –
retomo o propagandeado “Plano de Paz” entre Rússia e Ucrânia, a expressão
refinada da hipocrisia embalsamada na mais exímia diplomacia, como se demonstra
pelo simples exercício silogístico:
Nas premissas, proclama Xi o princípio sagrado da “soberania do território”.
Na conclusão do silogismo, o que resultou? O silêncio absoluto, nem foi tratado
nos três dias do grande simpósio inter-imperial. Porquê? Porque a China tem no
seu seio uma Ucrânia escondida: Taiwan! A ponto de já correr na gíria e na
análise geopolítica internacional a exacta definição: “Taiwan é a Ucrânia
chinesa”. A máscara de Xi – imperturbável como uma múmia e fulminante como a de
um tigre – caíu por terra. Ao defender, supostamente, a soberania da Ucrânia,
estará implicitamente a outorgar o estatuto independentista requisitado por Taiwan
e que conta com a apoio expresso dos EUA, caso a China intervenha militarmente.
Não é com gosto que abordo esta
temática. Muito pelo contrário, cansa-me e revolta-me este mundo concêntrico em
que nós, cidadãos comuns, ficamos reféns dos magnatas do capital, do armamento,
da mais repugnante hipocrisia, em que quem nos aperta a mão prepara-se para
afogar-nos o pescoço.
Xi
Jimping’s e Putin’s andam por aí, talvez à nossa beira. Livrar-nos deles é a
palavra de ordem!
23.Mar.23
Martins Júnior
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