Hoje
desço ao mar de onde vim. Mergulho na orla ribeirinha da minha materna baía:
Machico. E soam-me logo ao ouvido aquelas mensagens que rapazes e raparigas de
há 40 anos cantavam nas romagens das festas das Ribeira Seca, dedicadas á, na
altura, vila e hoje, cidade:
Baía que é um
abraço
Montanha que é
um sorriso
Em terras de
Machico
Deus fez um
paraíso
Mas
depois da reunião entre os executivos local e regional, de que hoje fazem eco
os matutinos, fico-me exausto e sem senso perante estes tremendos “trabalhos de Hércules” dos cavadores da
Quinta Vigia: os de ontem ergueram fatídicos “mausoléus” ; os de hoje têm que exumar e aguentar os enteados monstruosos, os pesados sem-abrigo que lhes caíram nas mãos. Oh hercúlea
folha de trabalhos de gerações político-partidárias! Não sabem que destino dar aos dois
emblemáticos monumentos do GR espetados no coração de Machico: um amontoado de
cimento escuro sobranceiro ao cais
principal e o pomposo “Forum”,
inaugurado em 2006, cujo custo apareceu como de 20 milhões de euros. Não sabem
o que fazer: se um anexo da Câmara Municipal, se uma unidade hoteleira.
É
tal o asco que a obra que o GR produziu em Machico nestes 40 anos, que nem me
apetece gastar um pingo de tinta nesse “peditório”. O rasto viscoso que deixou passa pela destruição do que de mais belo e
paisagístico tinha Machico, desde as milenares penedias do cais do
Desembarcadouro, o desmantelamento do Forte de São João Baptista, a estação de
tratamento de resíduos, a que os da terra chamam (tapem o nariz) “hotel da m….”, o vazadouro
das terras de um amigo partidário do Secretário Regional do Equipamento Social
(por sorte ou azar, natural e residente em Machico) na marginal nascente da
baía, até ao subsariano poço de areia amarela, à betonização das marés e ao monumental mostrengo do “Forum”,
toda esta cega-rega esbanjadora exige que se chamem à Justiça os devastadores
do nosso património ecológico e do erário pago pelo Povo. Aqueles que ontem,
por acomodação interesseira dentro do próprio partido, ficaram calados e
subservientes, agora engasgam-se com a batata quente que, cobardemente,
engoliram e lhes queima a garganta.
Ninguém,
com um mínimo de cultura urbanística, ignora que
o que foi feito na nossa zona ribeirinha foi um esquartejar às postas do
corpo virgem e espaçoso que a Mãe-Natura nos ofereceu como dádiva primeira: a
baía mais bem concebida e desenhada na ilha. A harmonia da traça original foi
amputada aos talhões mais díspares e tortuosos. Não houve a mínima estratégia de planificação.
Dou
um testemunho, em contraciclo: Mestre
Siza Vieira, quando cá esteve três dias, a meu pedido, intimou-me diante do
executivo municipal, com aquele seu característico tom de voz coloquial: “Presidente,
trate-me esta zona com pinças”. E deixou recomendações escritas. Não pôde demorar-se
mais tempo porque tinha de rumar imediatamente
a uma região da periferia de Paris, para quê? Imaginem! Para reconstituir o
mercado original da cidade porque a
edilidade de então decidiu derrubar o
moderno hipermercado monumental que ali se tinha instalado sobre a antiga
construção. Rememorando este episódio, há-de chegar o dia D --- já não será
para os meus olhos, mas será para outros --- em que o majestoso e encantado
anfiteatro da baía e da praia de Machico deixará ver-se na beleza atlântica do
seu berço, livre das amarras e espantalhos com que a afogaram, 600 anos depois.
Pede-se a quem
governa
Que esta lei se proponha
Acabar lá na
vila
Com os muros da
vergonha”
Assim
se proclamava o protesto popular nas referidas romagens. Entre 1980 e 1985. Ainda
lá estava o velhinho “pelado” Tristão Vaz Daí para a frente, os governantes não aprenderam
nada. Criminosos públicos perante as gerações vindouras!
O
mar de história, não de estórias, que eu tenho para contar sobre o terrorismo
que o camartelo da ignorância dos governantes (estou a recordar A.Garrett nas “Viagens
na Minha Terra) fez estrangular a primeira capitania da Madeira…
Mas
vou pôr já um ponto final, porque se me custa olhar, mais me dói reproduzir por
escrito os mal cheirosos esqueletos que
os senhores têm ao colo sem saber como lhes dar um implante de carne precária.
E sabendo, sobretudo, os enormes
esforços, repetida e publicamente
expressos, para travar tais atentados
suicidas, porque pagos pelos impostos do cidadão!
Fico
devendo a quem me acompanha, nesta área, uma explicação sobre o famigerado
processo do empreendimento com que a firma Saviotti pretendia literalmente ocupar toda a
superfície do citado campo Tristão Vaz. Podeis
crer que se trata de uma novela verídica (perdoem o paradoxo) que toda gente devia saber, particularmente o
Povo de Machico. Não deixeis que caia no esquecimento. Até depois!
17.Jul.2015
Martins Júnior
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