Se,
como se diz, “uma imagem vale mais que mil palavras”, também se lhe deve apor o
contraditório, acrescentando que uma palavra pode sugerir mais que mil imagens.
E foi, precisamente, esta tese-antítese que deu mote a uma intensa reflexão que
abala e todos os dias agita a aparente acalmia de quem se fez ao largo no vasto
oceano da vida. O meu caso, também.
Directo
ao assunto: a historiadora Raquel Varela publicou na sua página pessoal a
imagem que, com a devida licença, coloquei em epígrafe. Três padres amigos,
Tavares, José Luís Rodrigues e eu, aproveitámos a hora de almoço para colaborar
com a autora e com a investigadora brasileira Luísa Barbosa no estudo que ambas
decidiram fazer, tocando as margens da historiografia da Igreja na Madeira. E
comentou, ela própria, a foto, escrevendo: “três lados luminosos de uma Igreja
justa, transformadora”. Logo choveram comentários e denúncias em cima de duas
palavras apenas: ”Igreja justa”, os quais se sintetizam num único conceito, de
que a instituição não é nem nunca foi justa.
Uma
declaração, porém, voltou a bater-me como uma pedra pontiaguda na testa, até ao
peito: “Quem não se revê nos valores da instituição não faz parte dela”. Uma
proposta clara: sair, fugir, abandonar. Quantas vezes essa pergunta anda a
atormentar-me – a mim e a tantos outros companheiros de viagem! E é sempre a mesma
corrente das marés e contra-marés
constantemente a marulhar cá dentro, num
duelo febril!
Já
descobrimos, pelas vergastadas na vida, aquilo que nos esconderam em doze anos
de internato de seminário: que a Igreja-instituição não cumpre, detectámos a
olho-nu que ela despiu pomposamente o seu Fundador na praça pública, vimos que
ela apropriou-se despudoradamente do seu programa de luta pela Verdade, de humildade
e serviço, para transformá-lo num Império de ouro, de hegemonia mundana, de
corrupção acetinada. Não tenho dúvidas de que o Vaticano é o monstruoso muro da vergonha que nos impede de
ver o verdadeiro rosto do Cristo Histórico, Aquele que não se vergou perante a
ditadura religiosa dos magnates do Templo oficial de Jerusalém, mesmo nos
paroxismos da mais vil tortura no cadafalso raso do Calvário.
Mas,
então, porque continuas nesse antro de injustiça e hipocrisia?...
Vou
responder-lhe. Antes, porém, tentarei mostrar factualmente a radiografia de uma
instituição que subverteu, sem escrúpulos, todos os ideais libertadores do
Mestre que ela invoca todos os dias nos seus rituais, não para iluminar mas
para obscurecer os homens e mulheres de boa-fé. Presumo que o Império vai
continuar, séculos fora, não “por obra do Espírito Santo”, como abusivamente
apregoam os seus serventuários, mas pela capacidade mimética de adaptar-se a todos
os regimes de poder político e económico, o que levou o grande bispo e santo, Agostinho
de Hipona, a produzir, há 1.500 anos (séc.V)
esta cruel mas rigorosa sentença: Casta meretrix Ecclesia – “Igreja, casta
prostituta, meretriz sempre pura”.
Dispenso-me
de repetir, a este propósito, o que já referi
em outras circunstâncias: o incesto de poderes, que junta no mesmo
pescoço a cabeça do poder religioso e a cabeça do poder de Estado. E aí temos,
o Estado Vaticano a nomear embaixadores (iguais aos diplomatas leigos) com a
sacrílega chancela de “Núncios Apostólicos”. Oh Pedro Apóstolo, pescador do mar da Galileia, sai do túmulo e anda ver os
palácios e os galões cardinalícios com que se vestem os teus colegas de pesca,
a companha do teu barco!
Um
dia destes, um amigo emigrante venezuelano, de férias na Madeira,
confidenciou-me: “Sabe, o padre lá na minha cidade, que é meu amigo também, disse-me que esta Papa é comunista.
Afiançou-me que era”. Só porque Francisco
( a excepção clamorosa na história dos Papas!) toma a defesa frontal da justiça social. E por
essa razão os pilares da instituição, bispos e cardeais, uns em surdina, outros
abertamente (o americano Leo Burke, por ex.)) querem processá-lo, a Francisco,
como herege – que mais provas pretendemos
nós para classificar a instituição como marginal e defraudadora do Cristo
Histórico?!
Perante esta cegueira insanável, porque
maquiavelicamente elaborada, o Papa Francisco deveria abandonar não apenas o
trono do Vaticano mas a própria instituição-Igreja. Mas não o fez. Nem fará,
espero eu. E com esta proposta, já começo a justificar-me face à observação
de . É o que apresentarei no próximo
dia ímpar.
Martins Junior
07.Ago.17
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