Deixem-me começar com um desabafo,
fruto de uma constatação factual, colhida neste domingo: são falsas e
contraditórias todas as comemorações dos grandes acontecimentos da história!
Por outras palavras, as imitações destroem a realidade. Mesmo aquelas que se
reclamam de patrióticas, encomiásticas, exaltantes a mais não poder – todas vêm
deformadas, caricaturadas, ridículas. Porque os interesses dos seus promotores
são outros, que não os originais. Porque deturpam, amputam e apoucam a sua pureza
inicial, tudo cortado, acrescentado, talhado à medida dos ‘generosos’ promotores.
Está neste caso o dia de hoje – Domingo
de Palmas. Quando vejo nas reportagens televisivas os rituais, tão faustosos
quão anémicos, que se realizam mundo fora, não resisto à indignação e, de imediato,
ao sarcasmo que me sacodem interiormente.
Só por ver a manipulação pseudo-mística, quase esotérica, em que envolvem,
escondendo-o, um acontecimento concreto, vívido e espontâneo.
O que se passou então em Jerusalém? A maior
manifestação do poder do Povo – um Povo que ali acorreu das aldeias e
províncias vizinhas, na sua maioria camponeses e pastores nómadas, um Povo frágil
de meios, cujas armas reduziam-se apenas a ramos de palmeiras e oliveiras, cerrando
fileiras ao lado do seu Líder contra os barões dos hierarcas do Templo que já
tinham pronto até ao pormenor o plano de assassiná-lO. O Povo apercebeu-se que
os magnatas religiosos tinham consigo o beneplácito secreto do poder político.
Portanto, aquela manifestação concreta e autêntica desafiava simultaneamente os
donos da Religião oficial e os emissários políticos do Império.
Mas a multidão avançou e fez tremer a
cidade. Como que prenunciando o canto emblemático que mobilizaria os
portugueses no século XX, ali o grande rio que inundou a capital judaica
ressumava o histórico pregão: “Hoje, o Povo é quem mais ordena”. Que cenário
esse, pujante de verdade, realismo e encantamento! Vinham de suas casas, com o
traje do cote, cortavam ramos verdes, estendiam as capas pelo chão à passagem do
Mestre. Sem ninguém a presidir e sem espectadores de bancada, mas todos
participantes. Medos, para quê? Calculismos, rua! Liberdade em acção! Um por
todos e todos por Um! E o grito espontâneo, palavras de ordem ditas, cantadas a
plenos pulmões! “Bendito o que vem… Este é aquele que nos salva e liberta”!
Ao presenciar o exibicionismo de certos
cortejos, as alfaias tecidas a ouro, os capuzes episcopais nas ditas cabeças, quais
peças de museu arcaico, depois os pingos de água benta nos ramos – como se a
bênção dos homens fosse mais poderosa
que a bênção primeira do Deus Criador – outra constatação não nos acode senão a
de que todos estes rituais estão desajustados, adulterados, manipulados para
ostentação dos tais magnatas da velha e caduca Jerusalém.
Quem apoia a personalidade e o poder do
Povo? Quem o levanta? Quem escuta a sua voz, a sua angústia e, nalguns casos, a
sua justa revolta?... E quem apela à sua mobilização? Quem levanta o grito
libertador?... Hoje, felizmente uma voz
retumbou em todo o planeta. Foi a palavra de ordem do Papa Francisco,
neste Dia da Juventude: “Jovens, Gritai”!
Hoje é o dia em que o próprio Jesus de
Nazaré apoiou, integrou e abençoou o verdadeiro Poder Popular. Se não fosse o
Povo que rompeu, corajosos, para o centro da cidade, Ele teria sido assassinado
naquela hora.
A
partir do Domingo de Ramos, merecem aplausos e estão sublimadas, divinizadas todas as manifestações da história
humana em prol das Causas Justas, como as mais recentes nos EUA contra as armas.
Como contra a violência doméstica. Contra a fome. Pelo salário justo, pela
saúde, pela vida. Porque essas são as Causas do Nazareno, sempre vivo!
Palmas
maiores ao “Domingo de Palmas”!
25.Mar.18
Martins Júnior
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