quinta-feira, 9 de agosto de 2018

À MINÚSCULA CABEÇA DE UM FÓSFORO…

                                                                     

        Chegam-me à ponta dos pés, rasam-me os dedos das mãos e atacam-me os neurónios. São as labaredas que se soltam das serras de Monchique, das planuras-florestas da Califórnia e até das sempre verdes paisagens nórdicas do velho continente. Por cima das chamas e do furacão de gritos e protestos das vítimas e dos ‘bombeiros de bancada’, um risco de vertigem atravessa o espaço e petrifica-se aqui mesmo diante de mim, como uma estátua flamejante: é a cabeça desse minúsculo fósforo que fez a ignição primeira.
         Entre muitas, duas são as sensações que me fumegam os neurónios: saudação e respeito.
Saudação ao fogo que  “Prometeu agrilhoado”  roubou aos deuses, poema épico à luz que devassa as trevas, fermenta a seiva criadora e jorra as fagulhas do génio no cérebro humano!                                           
Respeito, que é medo e auto-humilhação perante o embrião que é gigante, implacável devorador!  Minúscula cabeça de um fósforo que depenas as montanhas, subjugas cidades, engoles bibliotecas: minúscula cabeça que fazes rolar cabeças sem rótulo e mentes liderantes, faustosos galões e tronos presidenciais! Cabeça de fósforo, seio procriador onde confluem a indomável força do macho e a intocável leveza da fêmea! Como é possível que o universo da ciência e da técnica – jóias preciosas do humano arsenal – não te dominem nem refreiem, minúsculo pingo fosforescente?...
                                                    
Minúsculos somos nós, quando te vemos rubro cavaleiro andante, soberano sem coração no pódio das nossas montanhas, vagabundo sem máscara roubando habitações, ceifando vidas a eito! Minúsculos, impotentes somos nós!... Porque assim quisemos.
“Em vez das lamúrias e imprecações ao vento, em vez dos rios de dinheiro comburente em sofisticados ‘hélis’ ou presunçosos  rodados, façam isto enquanto é tempo: agarrem-me, amputem a primeira ignição e nunca percam de vista esta minúscula cabeça que habita na ponta de um fósforo”!
Assim falou o vertiginoso raio de fogo que se soltou de Monchique para Machico, junto de mim. E para todo  o mundo. Só que o seu aviso não é de ontem ou de hoje ou de amanhã. É de sempre! Saibamos todos, governantes e governados, escutá-lo e cumpri-lo. Tanto basta para que a chama seja vida!   

09.Ago.18
Martins Júnior



    

 

Sem comentários:

Enviar um comentário