domingo, 27 de janeiro de 2019

OURO MACIÇO, OURO DURADOURO – UM TRÍPTICO PERFEITO


                                             
           
Aos domingos, “O Livro” abre-se em caracteres de luxo – preciosas jóias de literatura – que dispensam quaisquer aditamentos declarativos, tal a sua transparência, de forma e fundo. E hoje é um desses dias de frescura intuitiva. Aos três textos que nos são oferecidos neste III Domingo Comum, classifico-os de tríptico perfeito, ouro maciço e duradouro. Maciço, porque intrinsecamente compacto num entrançado homogéneo de fino quilate. Duradouro, porque vem de tempos imemoriais, milenares, com garantia de inquebrável longevidade.
Estou a referir-me aos três excertos bíblicos, lidos e comentados em todas as assembleias eucarísticas. Deles não poderá o nosso Nobel José  Saramago  afirmar a sentença com que classifica a Bíblia; “Quem a lê perde a fé”. Se, nalguns excertos, isso confere com a realidade, neste caso não, Aqui trata-se de uma progressão qualitativa no percurso social, intelectual e existencial de qualquer ser humano em viagem.
Vejamos, em síntese:
- “Não choreis nem vos entristeçais, ide felizes para vossas casa  e  preparai uma refeição suculenta, bebei vinho doce. Partilhai também com os que não têm. E deixai fora esse pranto, porque a alegria do Senhor é a vossa fortaleza”. Assim falava o presidente da assembleia ao povo reunido na sinagoga, o qual,  ao ouvir ler os normativos do “Livro da Lei”, enchia-se de pânico e desatava em lágrimas de compungida contrição no santuário judaico. Vale a pena cotejar o “Livro de Neemias” ((8, 2-10), para descobrirmos, enfim, que a espiritualidade genuína não está na encenação gestual, seja das bagatelas pias, seja da teatralidade ritual, A eficácia do verdadeiro culto traduz-se num saldo final, em que a alegria e a fortaleza começam no espírito e reflectem-se positivamente no corpo. Tudo o mais não passa de morbidez acumulada, complexos doentios injectados nas veias de crentes sem critérios.
Esta osmose da felicidade embutida entre espírito e matéria pressupõe o culto do corpo, sobretudo na sua dimensão social. É Paulo de Tarso, o fogoso Saulo de outrora, quem o escreve: “Somos muitos membros, mas um só e único Corpo, todos os membros são nobres, todos necessários,  interdependentes e todos orientados para o bem comum… O olho não pode dizer à mão ‘não preciso de ti’, nem a boca pode dizer aos pés ‘não preciso de vós’… E até os membros que parecem mais fracos são esses os mais necessários… Se um membro sofre, é o corpo todo que sofre com ele”. Constitui  uma magistral peça de pedagogia e anatomia metafórica o texto da Carta I Cor.12, 12-30.  Ouro puro e duradouro! Se as sociedades, seja qual a sua dimensão, (sobretudo a elite governante) usassem do mesmo critério, não haveria mais “Jamaicas”, nem mais greves,  nem mais prisões, nem mais paióis de material bélico…
   Finalmente, a liga que funde num só tríptico este alto-relevo maciço e inquebrável vem eloquentemente tecida no texto de Lucas, 1, 1-14: “Cumpriu-se hoje mesmo, aqui, o que estava  predito acerca de Mim: ‘Eu vim para anunciar a boa nova (um mundo novo) aos pobres, proclamar a libertação dos cativos, restituir a vista aos cegos e a liberdade aos oprimidos”!
Perdure, ao longo da semana,  diante dos nossos olhos este guião seguro que dirigiu gerações e projectou luz nos caminhos idos e na estradas a haver. Por aí é que acertaremos os nossos passos.
27.Jan.19
Martins Júnior

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