domingo, 27 de março de 2022

A PAZ ENTRE DUAS E MUITAS E TODAS AS GUERRAS

                                                                            


Fosse este Domingo o prenúncio da reunião de amanhã entre Rússia e  Ucrânia! Seria então o cessar-fogo definitivo, seria o tão angustiadamente almejado fim da guerra!

         Porque hoje foi dia de mudar de hora. E mais que mudar de hora, melhor seria mudar de era - a metamorfose pacificadora de passar das armas das trevas para as armas da luz, como escreveu Paulo de Tarso. Passar da razão da força para a força da razão! Ultrapassar a era do homem das cavernas e alcançar o reino do “Homo Sapiens”, uma humanização holística em que, de todos os outros, sobressai o talismã da Paz.

         Para entrarmos neste círculo virtuoso de pensamento e acção, sugiro a leitura do LIVRO – o ponto alto entre uma semana e outra deste Senso & Consenso – mais precisamente, no capítulo 15,11-32, de Lucas: o vigoroso e, ao mesmo tempo, comovente episódio conhecido por ‘Regresso do Filho Pródigo’.  Como todos os textos plenos de profundidade e vastidão, dispensa comentários excedentários: melhor senti-lo que explicá-lo.

         Estão ali sectorialmente desenhadas as guerras de diferentes tipologias; as classistas, as familiares, as psicológicas. E de entre todas, avulta o pedagogo exemplar e o criador ficcionista de uma realidade sociológica incontornável – o Nazareno – cujo poder comunicacional pretende um bem maior, o da reconciliação. Numa palavra, a Paz duradoura.

         Sintetizando. Duas classes: de um lado,  os fariseus, os doutores da Lei, a classe aristocrática e, do outro, os publicanos, os pecadores, os párias, os proletários, os da valeta. No meio, um Líder, um Mestre, um Amigo solidário com os valeta, ao qual a classe dominante lança uma campanha pública de arrasar: “Esse homem só faz camaradagem com os pecadores, come e bebe com eles”, é mais um demagogo que aí anda, um populista da ralé – diríamos hoje.

         Então aqui surge o criador ficcionista da realidade: a parábola em que entram um pai e dois filhos, o mais novo a reclamar prematuramente a herança, que viria a dissipá-la, pouco depois, numa vida dissoluta com prostitutas, diz claramente o Mestre. O mais velho, porém,  sempre fiel ao pai, trabalhador, poupado, sensato. Na trama da ficção (decalcada do real quotidiano) o jovem, reduzido à miséria extrema, ganha força anímica, volta à casa paterna, reconhece o erro, pede perdão e há festa grande, música, danças e ementa opípara. O irmão, o mais velho, regressando do trabalho nos campos, recusa-se a entrar em casa, alegando que o mais novo não merecia aquela pompa injustificada. O pai, sempre apaziguador, vem cá fora e convence o filho a entrar e a congratular-se festivamente porque “este teu irmão estava morto e voltou à vida, estava perdido e foi reencontrado”.

           É de uma vastidão interminável, abrangente e universal a radiografia impressa neste episódio ficcional revelador da sociedade em que vivemos, em que sempre se viveu e há-de viver. Quem não se sente identificado com esta ‘ressonância’ psico-social de várias direcções: pais, educadores, professores, governantes, políticos?... Quanto custam os pedregosos caminhos da reconciliação!

         Terá Putin, o cristão Putin, na sua basílica da ortodoxia oficial, terá lido o texto proposto para este Domingo? Ter-se-á ele colocado no papel do filho pródigo que continua a destruir não só os bens do seu povo e jovens soldados, filhos do povo, mas também, criminosamente, os bens e vidas alheias na Ucrânia?! … Quando regressará ele à Casa do Pai?... e deixará que os mártires ucranianos voltem às suas casas, embora  destruídas?... O problema, o trágico e inultrapassável dilema, é que o deus dele é o deus da guerra, o mitológico Marte travestido de um deus cristão. E tem a seu lado, o sacro ou sacrílego lugar-tenente, o Arcebispo Cirilo de Moscovo, que banha em luzidia água-benta as metralhadoras e os tanques de guerra!

Se ao menos viesses, Jesus de Nazaré, e te sentasses à mesa das conversações russo-ucranianas e aí lhes recontasses o episódio do Filho Pródigo…  

 

27.Mar. 22

Martins Júnior

1 comentário:

  1. Não acaba..... Eles se consideram a terceira "Roma" e quando a igreja da Ucrânia nacionalizou as propriedades da igreja russa, aí começaram as desavenças... É uma guerra "religiosa".... que o ocidente ateu não consegue compreender.

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