Para
quem não conhece as nossas tradições, eu abro as folhas já puídas do Natal e
Ano Novo do leste da Ilha - puídas as folhas, mas não a alma delas – pois que
em Santa Cruz, da Madeira, a ‘Festa’ termina em 15 de Janeiro, Dia do Santo
Amaro, Orago da Freguesia e, coincidentemente, Dia Oficial do Município.
Mas
a criatividade dos ilhéus puxados para o extremo oriental da Pérola do
Atlântico não tem limites e ‘decretou’ que o epílogo dos acordes natalícios
teria de coincidir com o Dia de São Sebastião, Padroeiro da Vila do Caniçal, 20
de Janeiro, estendendo-se por todo o fim-de-semana, sábado,21 e domingo, 22.
E
cá estamos nós, vizinhos do Caniçal, acompanhando o rufar dos tambores, o
saltitar dos chocalhos e o agitar das vassouras para varrer os armários . E não
só. Sobretudo para coroar o pequeno monumento do PRESÉPIO PÚBLICO com as joias
de um percurso de 600 anos habitados pela população da Ribeira Seca e já
sucintamente narrados em blogs
anteriores.
O CARRILHÃO DA NOSSA
TORRE – “SINO CORAÇÃO DA ALDEIA, CORAÇÃO SINO DA GENTE” – 1999
CASTIGO SEM CRIME E
ABSOLVIÇÃO SEM PROCESSO – UM PASSEIO FORÇADO DE 42 ANOS, SUSPENSO ENTRE AS
GALÁXIAS DO ESPANTO, DA DESCRENÇA E DA
MADUREZA NA FÉ – de 1977 A 2019
Joias
da coroa – assim qualifiquei os dois acontecimentos que estão gravados no adro
em genuínos calhaus brancos da Ilha e reconfigurados no vértice do palco aberto
da Ribeira Seca. Joias, sim, mas descartadas da grande informação regional.
Joias, sim e preciosas, coladas ao coração das gentes que sofreram, lutaram,
condenadas a engolir monstros sacro-satânicos da religião e da política!
Alegrias íntimas, quase silenciosas para os viventes e saudades longas para
aqueles que levaram até à sepultura os soluços sentidos e maiores que eles as
esperanças numa vitória que não chegaram a ver os olhos do corpo, mas
deixaram-nas como herança aos descendentes vindouros!
Perdoe-me
quem me lê até este instante. Mas o teclado escapa-se-me dos dedos ao tentar
dizer e identificar o brilho dos factos que quero contar. E paro, absorto, como
quem ‘puxou para trás’ um filme já vivido, mas nunca visto até ao dia de hoje.
Ocorre-me um pensamento da juventude,
atribuído a Lacordaire, o eloquente
orador do púlpito de Notre Dâme
de Paris: “Uma dor, quando é grande, dá-nos para gritar. Mas quando é muito
grande, quando ela é enorme, dá-nos para silenciar”. Pois bem, o vocábulo ‘dor’
(ou desgosto) neste momento substituo-o pelo seu antónimo ‘prazer’ (gosto.
alegria, conforto) – quando ele é grande apetece-nos cantar aos quatro
ventos. Mas quando é enorme, dá-nos para
calar e sentir”.´
Hoje,
parei, porque estou neste segundo tempo emocional. Amanhã, retomarei o
contexto. Porque faz parte de uma pequena-grande história, a nossa. E também
porque me entra na alma “e fica em mim presa” a voz centenária de Eugénio de
Andrade:
“É
urgente
Descobrir
rosas e rios
E
manhãs claras…”
21.Jan.23
Martins
Júnior
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