Raras vezes, como agora, o mundo montou palco para aí fazer representar, na grande ribalta, o zénite e o nadir da espécie humana, colocando em cena epifenómenos contraditórios, personagens diametralmente opostas e, ao mesmo tempo, singularmente idênticas no que têm de mais estrutural e sensível, tudo uma conjuntura que nos faz ampliar o “Grande Teatro do Mundo” de Pedro Calderon de La Barca.
Aí
estão os epifenómenos do Natal e Ano Novo, com o furor das intempéries perto e
longe, a que se junta a barbárie da humana ferocidade bélica.
Mas
o desconcerto que melhor define a época é-nos fornecido, ao mais alto nível,
pelo êxodo forçado de dois ídolos monumentais da nossa história contemporânea,
cada um em seu trono diverso: Joseph
Ratzinger (Bento XVI) e Edson Arantes Nascimento (Pelé). A coincidência
cronológica, a exposição pública, os rituais diferentes no aparato mas iguais
na atmosfera envolvente, o desfile das multidões e as centenas de jornalistas
presentes, todo um cenário que inspira um mausoléu perfeito e até nos faz
imaginar que os dois ‘Réis’ vão a sepultar na mesma urna da fraternidade
humana.
Mas
outra aura convergente fala mais alto e agrega num mesmo tronco os dois nobres
passageiros da ‘barca de Caronte’ – precisamente os que ficam no seu lugar,
após o adeus final, as mãos que lhes ‘fecharam os olhos’ e agora transportam todo o brilho da sua herança
no cortejo dos vivos– Francisco Papa e Lula Presidente.
Faria
eu bem melhor se apagasse tudo o que escrevi acima e chamasse de novo o
“Príncipe da Língua Portuguesa”, ilustre filho do Brasil, Padre António Vieira,
para definir tão excelsa simbiose:
“Pó caído, Pó erguido”!
Ratzinger
e Pelé – Pó caído!... Francisco e Lula – Pó erguido!...
Os
dois ‘caídos’ - e com missão cumprida.
Os
dois ‘erguidos’ - e com missão continuada, também estes provisórios até um dia.
Enfim,
a efémera e gloriosa condição humana. A nossa!
À
consideração pessoal e intransmissível.
03.Jan.23
Martins Júnior
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